segunda-feira, dezembro 02, 2002

eu nem vou comentar, tá?
PUNK DE EMOÇÕES , O Globo, 26/11/2002
Renan Correia, de 16 anos, gosta de anotar frases que falam de amor para depois escrevê-las nas cartas que manda para a namorada. Mas não são poetas como Carlos Drummond de Andrade ou Chico Buarque os preferidos pelo menino. O que Renan mais copia são as letras de uma banda punk.
Calma, ele não acha que a namorada vá ficar pensando nele lendo frases de efeito contra tudo isso que está aí. O punk feito pelo Emo, grupo carioca admirado por Renan, é bem diferente do de bandas como o Sex Pistols, só para citar o nome mais associado ao gênero. A onda do Emo é o emo. Entendeu? Vamos lá: emo é a abreviação de emotional hardcore, combinação de punk melódico com letras "sensíveis" que vem ganhando um número cada vez maior de adeptos no Brasil e no mundo.
Aqui, o maior expoente do emo é o grupo paulista CPM 22, que se apresenta domingo no Ballroom e lançou há um mês o seu segundo CD, "Chegou a hora de recomeçar", já com 50 mil cópias vendidas. O disco homônimo de estréia vendeu 115 mil unidades graças ao sucesso radiofônico "Regina let's go!". Nesta sexta-feira, quem toca na casa do Humaitá é o Emo, que ainda não tem gravadora mas foi apadrinhado pelo raimundo Digão. No Estados Unidos, atualmente os grandes nomes do emo - que começa a roubar do carrancudo new metal o posto de queridinho dos jovens americanos - são Dashboard Confessional, Jimmy Eat World e Box Car Racer (os dois últimos tiveram discos lançados no Brasil este ano).
"Estar com você, nada é melhor/ estar com você, me faz pensar em nós dois", canta Badaui, vocalista do CPM 22, em "Vidas que se encontram", do CD novo. Será que os punks tradicionais não ficam com o moicano ainda mais de pé ouvindo isso? Badaui diz que não:
- O preconceito diminuiu muito e o punk rock se ampliou. A gente não chega nos lugares e ouve que somos uma comédia.
Badaui aponta um outro motivo para os fãs de Pistols e cia. não saírem do sério com os punks com emoção:
- Por causa de bandas como a nossa a molecada está correndo atrás para conhecer os grupos das antigas.
Para Japinha, baterista do CPM 22, o emo está crescendo no mundo porque os jovens hoje não têm medo de falar sobre relacionamentos:
- Antigamente homem não podia chorar. Hoje não tem mais isso. O cara ouve uma música e se emociona sim.
As letras do tipo de-peito-aberto são o que mais atraem novos fãs. Renan, o das cartinhas para a namorada, adorou as frases românticas e carregadas de ideologia da Emo.
- Vendem a idéia de que punk é só revolta mas não é verdade. Punk também pode amar - brinca.
Mayara Costa, de 13 anos, amiga de Renan, até gosta do punk revoltado, mas também prefere o que fala sobre relacionamentos. As melodias do emo fazem com que as letras de bandas como CPM 22 e Emo grudem ainda mais no ouvido dos fãs. Foi o faro pop da Emo que fez com que Digão caísse de amores pela banda.
- Eles são muito musicais - derrete-se o raimundo, que tenta arranjar uma gravadora para o grupo novato e diz que os punks podem amar sim. - Ou melhor, ou punks devem amar.
Apesar de ser desconhecido da maioria das pessoas, o punk que usa e abusa de sentimentos nas letras não é recente. Daniel Ferro, baterista da Emo, conta que o gênero nasceu no começo dos anos 90.
- O hardcore tinha esgotado todas as possibilidades do punk. Nessa época o (grupo americano) Fugazi começou a fazer músicas com letras românticas. - diz ele. - Outros começaram a aderir à idéia do intimismo.
De lá para cá o entusiasmo mundial pelo emo só cresceu. Em alguns casos, a paixão é contagiante.
- Uma fã nos contou que deu uma demo do Emo para o carinha por quem estava apaixonada e em três dias eles começaram a namorar - lembra Daniel, rindo.
Eles gostaram tanto da história que mandaram fazer adesivos e camisetas com a frase "Emo - Traz a pessoa amada em três dias".
No Brasil, o emo também tem raízes nos 90. Os capixabas do Dead Fish fazem hardcore melódico com letras que falam de sentimentos há uma década. Na esteira vieram Noção de Nada, Discoteque, Rivets, Supertrumpho (todos do Rio) e Garage Fuzz e Hateen (de São Paulo), entre outros.
Como o emo é mil vezes mais palatável que o punk tradicional - até no visual, pois os adeptos do emo preferem o visual street wear a casacos de couro com tachinhas e coturnos - a expectativa da indústria fonográfica é de que o gênero conquiste fãs fora do universo roqueiro tradicional. Gente como a modelo Yasmin Brunet, que disse recentemente querer namorar um garoto punk, e o ator Daniel Radcliffe, o Harry Potter, que está apaixonado por The Clash e Sex Pistols. Sid Vicious deve estar se revirando na tumba...

Será você? Que vai ver o tempo passar E as mudanças ao nosso redor Te conhecer, saber como é você Há muito tempo para ver O que tiver que acontecer Espero sempre ter alguém Especial como você Uma pessoa pra sempre admirar (...) Trecho de "Especial como você", do CPM 22
Quando a chuva cair Ainda há pouco eu ouvi Pingos vindo lá do céu Pensamento foi em ti Mãos procuram papel Pra tentar escrever quanto eu amo você Pra mandar um bilhete assim (...) Trecho de "Quando a chuva cair", do Emo

"Quero conhecer um garoto punk. Eles pouco se importam com a opinião dos outros" - Yasmin Brunet, no site de sua mãe Luiza
"Gosto da atitude do punk, do jeito que a música soa" - Daniel Radcliffe no lançamento de "Harry Potter"

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